====== Merleau-Ponty (FP) – recordações ====== (MPPF) Mas só depois a experiência passada pôde aparecer como causa da ilusão, foi preciso que a experiência presente primeiramente adquirisse forma e sentido para fazer voltar justamente esta **recordação** e não outras. Intro II A “figura” e o “fundo”, a “coisa” e o seu “redor”, o “presente” e o “passado”, estas palavras resumem a experiência de uma perspectiva espacial e temporal, que finalmente leva ao apagamento da **recordação** ou àquele das impressões marginais. Intro II Mas na realidade eu não saberia que possuo uma ideia verdadeira se não pudesse, pela memória, ligar a evidência presente àquela do instante escoado e, pelo confronto da fala, a minha evidência à do outro, de forma que a evidência spinozista pressupõe aquela da **recordação** e da percepção. Intro III Pois não identifico o objeto detalhado que agora tenho com aquele sobre o qual meu olhar há pouco deslizava, comparando expressamente estes detalhes com uma **recordação** da primeira visão de conjunto. Intro IV Nenhuma **recordação** expressa, nenhuma conjectura explícita poderiam desempenhar este papel: elas só apresentariam uma síntese provável, enquanto minha percepção se apresenta como efetiva. Intro IV Seria preciso dizer então que o membro fantasma é uma **recordação**, uma vontade oti uma crença e, na falta de uma explicação fisiológica, dar uma explicação psicológica? Todavia, nenhuma explicação psicológica pode ignorar que a secção dos condutos sensitivos que vão para o encéfalo suprime o membro fantasma. Intro I Se agora damos uma explicação psicológica dos fenômenos, o membro fantasma torna-se uma **recordação**, um juízo positivo ou uma percepção, a anosognose um esquecimento, um juízo negativo ou uma não-percepção. Intro I Evidentemente, essa fixação não se confunde com uma **recordação**, ela até mesmo exclui a **recordação** enquanto esta expõe uma experiência antiga como um quadro diante de nós e enquanto, ao contrário, este passado que permanece nosso verdadeiro presente não se distancia de nós e esconde-se sempre atrás de nosso olhar em lugar de dispor-se diante dele. Intro I Portanto, todo recalque é a passagem da existência em primeira pessoa a um tipo de escolástica dessa existência, que vive para uma experiência antiga ou antes para a **recordação** de tê-la tido, depois para a **recordação** de ter tido essa **recordação** e assim por diante, a ponto de que finalmente ela só retenha sua forma típica. Intro I As **recordações** que se evocam diante do amputado induzem um membro fantasma, não como no associacionismo uma imagem chama uma outra imagem, mas porque toda **recordação** reabre o tempo perdido e nos convida a retomar a situação que ele evoca. Intro I Se a **recordação** e a emoção podem fazer aparecer o membro fantasma, não é como uma cogitatio exige uma outra cogitatio, ou como uma condição determina sua consequência — não é porque uma causalidade da ideia se superponha aqui a uma causalidade fisiológica, é porque uma atitude existencial motiva uma outra e porque **recordação**, emoção, membro fantasma são equivalentes em relação ao ser no mundo. Intro I Essa história do psiquismo que ele desenvolvia na atitude objetiva, ele já possuía seus resultados diante de si, ou antes, em sua existência, ele era seu resultado contraído e sua **recordação** latente. Intro II Não se trata da “**recordação**” visual ou motora da posição da mão no ponto de partida: lesões cerebrais podem deixar a **recordação** visual intacta ao mesmo tempo em que suprimem a consciência do movimento e, quanto à “**recordação** motora”, é claro que ela não poderia determinar a presente posição de minha mão se a própria percepção da qual ela nasceu não incluísse uma consciência absoluta do “aqui”, sem a qual seríamos reenviados de **recordação** a **recordação** e nunca teríamos uma percepção atual. Intro III Assim como está necessariamente “aqui”, o corpo existe necessariamente “agora”; ele nunca pode tornar-se “passado”, e se no estado de saúde não podemos conservar a **recordação** viva da doença, ou na idade adulta a **recordação** de nosso corpo quando éramos crianças, essas “lacunas da memória” apenas exprimem a estrutura temporal de nosso corpo. Intro III Não há aqui lugar para uma “**recordação**” da localização das teclas e não é no espaço objetivo que o organista toca. Intro III Aqui, da mesma maneira, a moça não deixa de falar, ela “perde” a voz, como se perde uma **recordação**. Intro V Também é verdade que, como o mostra a psicanálise, a **recordação** perdida não é perdida por acaso, ela só o é enquanto pertence a uma certa região de minha vida que eu recuso, enquanto ela tem uma certa significação e, como todas as significações, esta só existe para alguém. Intro V Portanto, o esquecimento é um ato; eu conservo à distância essa **recordação**, assim desvio o olhar de uma pessoa que não quero ver. Intro V Todavia, como a psicanálise também o mostra muito bem, se a resistência supõe uma relação intencional com a **recordação** à qual se resiste, ela não a põe diante de nós como um objeto, ela não a rejeita expressamente. Intro V Não se pode dizer que a situação de fato assim criada seja a simples consciência de uma situação, pois isso representaria dizer que a **recordação**, o braço ou a perna “esquecidos” estão expostos à minha consciência, estão presentes e próximos para mim do mesmo modo que as regiões “conservadas” de meu passado ou de meu corpo. Intro V A **recordação** ou a voz são reencontradas quando o corpo se abre novamente ao outro ou ao passado, quando se deixa atravessar pela coexistência e quando novamente (no sentido ativo) significa para além de si mesmo. Intro V Mas também não é conservar da palavra alguma “**recordação** pura”, alguma percepção enfraquecida. Intro VI A alternativa bergsoniana entre a memória-hábito e a **recordação** pura não dá conta da presença próxima das palavras que conheço: elas estão atrás de mim, assim como os objetos estão atrás de minhas costas ou como o horizonte de minha cidade está. Intro VI Eu “possuo”, eu “tenho” o objeto distante sem posição explícita da perspectiva espacial (grandeza e forma aparentes), assim como “ainda tenho em mãos” o passado próximo sem nenhuma deformação, sem “**recordação**” interposta. II II Por exemplo, a grandeza verdadeira de meu porta-caneta não é como uma qualidade inerente a tal de minhas percepções do porta-caneta, ela não é dada ou constatada em uma percepção, como o vermelho, o quente ou o açucarado; se ela permanece constante, não é que eu conserve a **recordação** de uma experiência anterior em que a teria constatado. II III Quando a distância é muito grande ou a iluminação tem uma cor própria, como ao pôr-do-sol ou sob luz elétrica, desloco a cor efetiva em benefício de uma cor da **recordação**, que é preponderante porque está inscrita em mim por numerosas experiências. II III Pois, considerando a própria percepção, não se pode dizer que o pardo da mesa se ofereça sob todas as iluminações como o mesmo pardo, como a mesma qualidade efetivamente dada pela **recordação**. II III Não apenas me sirvo de meus dedos e de meu corpo inteiro como de um só órgão, mas ainda, graças a essa unidade do corpo, as percepções táteis obtidas por um órgão são imediatamente traduzidas na linguagem dos outros órgãos; por exemplo, o contato de nossas costas ou de nosso peito com o linho ou a lã permanece na **recordação** sob a forma de um contato manual, e, mais geralmente, na **recordação** podemos tocar um objeto com partes de nosso corpo que nunca o tocaram efetivamente. II III O duro e o mole, o granuloso e o liso, a luz da lua e do sol em nossa **recordação** se oferecem antes de tudo não como conteúdos sensoriais, mas como um certo tipo de simbiose, uma certa maneira que o exterior tem de nos invadir, uma certa maneira que nós temos de acolhê-lo, e aqui a **recordação** apenas resgata a armação da percepção da qual ela nasceu. II III Da mesma maneira, o amor verdadeiro convoca todos os recursos do sujeito e o interessa por inteiro, o falso amor só concerne a um de seus personagens, “o homem de quarenta anos”, se se trata de um amor tardio, “o viajante”, se se trata de um amor exótico, “o viúvo”, se o falso amor é produzido por uma **recordação**, “a criança”, se ele é produzido pela **recordação** da mãe. III I A pintura de Van Gogh está instalada em mim para sempre, foi dado um passo em relação ao qual não posso voltar atrás, e, mesmo se não guardo nenhuma **recordação** precisa dos quadros que vi, toda a minha experiência estética será doravante a de alguém que conheceu a pintura de Van Gogh, exatamente como um burguês que se tornou operário permanece para sempre, até em sua maneira de ser operário, um burguês-tornado-operário, ou assim como um ato nos qualifica para sempre, mesmo se em seguida nós o renegamos e mudamos de crenças. III I Se meu cérebro conserva os traços do processo corporal que acompanhou uma de minhas percepções, e se o influxo nervoso passa novamente por esses caminhos já percorridos, minha percepção reaparecerá, terei uma nova percepção, enfraquecida e irreal, se se quiser, mas em caso algum essa percepção, que é presente, poderá indicar-me um acontecimento passado, a menos que sobre meu passado eu tenha uma outra visão que me permita reconhecê-la como **recordação**, o que é contra a hipótese. III II Existem sínteses de identificação, mas apenas na **recordação** expressa e na evocação voluntária do passado distante, quer dizer, nos modos derivados da consciência do passado. III II Por exemplo, hesito sobre a data de uma **recordação**, tenho diante de mim uma certa cena, não sei em que ponto do tempo prendê-la, a **recordação** perdeu sua ancoragem, posso então obter uma identificação intelectual fundada, por exemplo, na ordem causal dos acontecimentos: mandei fazer este traje antes do armistício, já que logo depois não se encontravam mais tecidos ingleses. III II Ao contrário, quando reencontro a origem concreta da **recordação**, é porque esta se recoloca em uma certa corrente de temor e de esperança que vai de Munique à guerra, é porque encontro o tempo perdido, é porque, desde o momento considerado até meu presente, a cadeia das retenções e o encaixe dos horizontes sucessivos asseguram uma passagem contínua. III II Os próprios referenciais objetivos em relação aos quais, na identificação mediata, eu localizo minha **recordação** e, em geral, a síntese intelectual só têm um sentido temporal porque pouco a pouco a síntese da apreensão me liga a todo o meu passado efetivo. III II Quando a grandeza aparente de um objeto varia com sua distância aparente, ou sua cor aparente com as **recordações** que dela temos, reconhece-se que “os processos sensoriais não são inacessíveis a influências centrais”. Intro I Através disso, pode-se ver o que valem as fórmulas usuais sobre o “papel das **recordações** na percepção”. Intro II Mostra-se que na leitura de um texto a rapidez do olhar torna lacunares as impressões retinianas, e que os dados sensíveis devem portanto ser completados por uma projeção de **recordações**. Intro II Uma paisagem ou um jornal vistos às avessas nos representariam a visão originária; a paisagem ou o jornal vistos normalmente são mais claros apenas pelo que as **recordações** ali acrescentam. “ Intro II É que, para vir a completar a percepção, as **recordações** precisam ser tornadas possíveis pela fisionomia dos dados. Intro II Assim, o apelo às **recordações** pressupõe aquilo que ele deveria explicar: a colocação em forma dos dados, a imposição de um sentido ao caos sensível. Intro II No momento em que a evocação das **recordações** é tornada possível, ela se torna supérflua, já que o trabalho que se espera dela já está feito. Intro II Mas a partir do que nós acreditamos? O que é que, na percepção atual, nos ensina que se trata de um objeto já conhecido, já que por hipótese suas propriedades estão modificadas? Se se quer que o reconhecimento da forma ou da grandeza leve ao reconhecimento da cor, estamos em um círculo, já que a grandeza e a forma aparentes também estão modificadas e, ainda aqui, o reconhecimento não pode resultar do despertar das **recordações**, mas deve precedê-lo. Intro II Portanto, do passado ao presente, ele não vai a parte alguma e a “projeção das **recordações**” é apenas uma má metáfora que esconde um reconhecimento mais profundo e já feito. Intro II Da mesma forma, enfim, a ilusão do revisor não pode ser compreendida como a fusão de alguns elementos verdadeiramente lidos com **recordações** que se misturariam a eles a ponto de não mais se distinguirem. Intro II Como se faria a evocação das **recordações** sem ser guiada pelo aspecto dos dados propriamente sensíveis, e, se ela é mal dirigida, para que serviria já que agora a palavra já tem sua estrutura ou sua fisionomia antes de buscar algo no tesouro da memória? Foi evidentemente a análise das ilusões que deu crédito à “projeção das **recordações**”, segundo um raciocínio sumário que é mais ou menos este: a percepção ilusória não pode apoiar-se nos “dados presentes”, já que eu leio “almoço” ali onde o papel traz “alvoroço”. Intro II Ela imita esta experiência privilegiada em que o sentido recobre exatamente o sensível, articula-se visivelmente ou se profere nele; ela implica esta norma perceptiva; não pode portanto nascer de um encontro entre o sensível e as **recordações**, e a percepção muito menos ainda. Intro II A “projeção das **recordações**” torna uma e outra incompreensíveis. Intro II Pois uma coisa percebida, se fosse composta de sensações e de **recordações**, só seria determinada pelo auxílio das **recordações**, ela nada teria então em si mesma que pudesse limitar-lhes a invasão, ela não teria apenas este halo de “movido” que sempre tem, nós o dissemos, ela seria inapreensível, fugidia e sempre beirando a ilusão. Intro II Se enfim se admite que as **recordações** não se projetam por si mesmas nas sensações, e que a consciência as confronta com o dado presente para reter apenas aqueles que se harmonizam com ele, então reconhece-se um texto originário que traz em si seu sentido e o opõe àquele das **recordações**: este texto é a própria percepção. Intro II Em suma, está-se muito errado em acreditar que com a “projeção das **recordações**” se introduza na percepção uma atividade mental, e que se esteja no oposto do empirismo. Intro II Como toda teoria empirista, esta só descreve processos cegos que nunca podem ser o equivalente de um conhecimento, porque não existe, neste amontoado de sensações e de **recordações**, ninguém que veja, que possa experimentar o acordo entre o dado e o evocado — e correlativamente nenhum objeto firme protegido por um sentido contra o pulular das **recordações**. Intro II Retornando aos fenômenos, encontramos como camada fundamental um conjunto já pleno de um sentido irredutível: não sensações lacunares, entre as quais deveriam encravar-se **recordações**, mas a fisionomia, a estrutura da paisagem ou da palavra, espontaneamente conformes às intenções do momento, assim como às experiências anteriores. Intro II Perceber não é experimentar um sem-número de impressões que trariam consigo **recordações** capazes de completá-las, é ver jorrar de uma constelação de dados um sentido imanente sem o qual nenhum apelo às **recordações** seria possível. Intro II Ora, para o empirismo, os objetos “culturais” e os rostos devem sua fisionomia, sua potência mágica, a transferências e a projeções de **recordações**; o mundo humano só tem sentido por acidente. Intro II Não conservo mais em mãos a circunvizinhança distante: ela não é mais feita de objetos ou de **recordações** ainda discerníveis, é um horizonte anônimo que não pode mais fornecer testemunho preciso, deixa o objeto inacabado e aberto, como ele é, com efeito, na experiência perceptiva. Intro IV Nós esqueceremos a presente percepção da casa: cada vez que podemos confrontar nossas **recordações** com os objetos aos quais elas se reportam, levando em conta outros motivos de erro, somos surpreendidos pelas mudanças que eles devem à sua própria duração. Intro IV É preciso compreender então como os determinantes psíquicos e as condições fisiológicas engrenam-se uns aos outros: não se concebe como o membro fantasma, se depende de condições fisiológicas e se a este título é o efeito de uma causalidade em terceira pessoa, pode por outro lado depender da história pessoal do doente, de suas **recordações**, de suas emoções ou de suas vontades. Intro I Primeiramente, por que as **recordações** que se relembra ao amputado podem fazer aparecer o membro fantasma? O braço fantasma não é uma rememoração, ele é um quase-presente, o mutilado o sente atualmente dobrado sobre seu peito sem nenhum índice de passado. Intro I Ela visa uma região de nossa experiência, uma certa categoria, um certo tipo de **recordações**. Intro V Assim, na histeria e no recalque podemos ignorar algo ao mesmo tempo em que o sabemos, porque nossas **recordações** e nosso corpo, em lugar de se apresentarem a nós em atos de consciência singulares e determinados, dissimulam-se na generalidade. Intro V Descobrimos através disso que as mensagens sensoriais ou as **recordações** só são apreendidas expressamente e por nós conhecidas sob a condição de uma adesão geral à zona de nosso corpo e de nossa vida da qual elas dependem. Intro V No próprio instante em que vivo no mundo, em que me dedico aos meus projetos, a minhas ocupações, a meus amigos, a minhas **recordações**, posso fechar os olhos, estirar-me, escutar meu sangue que pulsa em meus ouvidos, fundir-me a um prazer ou a uma dor, encerrar-me nesta vida anônima que subtende minha vida pessoal. Intro V A psicologia envolveu-se em dificuldades sem fim quando quis fundar a memória na posse de certos conteúdos ou **recordações**, traços presentes (no corpo ou no inconsciente) do passado abolido, pois a partir desses traços nunca se pode compreender o reconhecimento do passado enquanto passado. II II Da mesma maneira, nunca se compreenderá a percepção da distância se se partir de conteúdos dados em uma espécie de equidistância, projeção plana do mundo como as **recordações** são uma projeção do passado no presente. II II Assim como na “conservação das **recordações**” não existe discussão a instituir, mas apenas uma certa maneira de olhar o tempo que torna o passado manifesto enquanto dimensão inalienável da consciência, não existe problema da distância e a distância é imediatamente visível, sob a condição de que saibamos reencontrar o presente vivo em que ela se constitui. II II O amor está nos buquês que Félix de Vandenesse prepara para Madame de Mortsauf tão claramente quanto em uma carícia: “Eu pensava que as cores e as folhagens tinham uma harmonia, uma poesia que, encantando o olhar, vinha à luz no entendimento, assim como frases musicais despertam mil **recordações** no fundo dos corações amantes e amados. II III Acreditamos que para nós mesmos nosso passado se reduz às **recordações** expressas que podemos contemplar. III I Todavia, é isso que fazem os psicólogos, quando procuram “explicar” a consciência do passado pelas **recordações**, a consciência do porvir pela projeção dessas **recordações** diante de nós. III II A refutação das “teorias fisiológicas” da memória, em Bergson por exemplo, situa-se no terreno da explicação causal; ela consiste em mostrar que os traços cerebrais e os outros dispositivos corporais não são a causa adequada dos fenômenos de memória; que, por exemplo, no corpo não encontramos com o que dar conta da ordem na qual as **recordações** desaparecem em casos de afasia progressiva. III II Mas essas intenções se agarram a **recordações** conservadas “no inconsciente”, a presença do passado na consciência permanece uma simples presença de fato; não se viu que nossa melhor razão para rejeitar a conservação fisiológica do passado também é uma razão para rejeitar a “conservação psicológica”, e esta razão é que nenhuma conservação, nenhum “traço” fisiológico ou psíquico do passado pode fazer compreender a consciência do passado. III II O passado e o porvir não podem ser simples conceitos que nós formaríamos por abstração a partir de nossas percepções e de nossas **recordações**, não podem ser simples denominações para designar a série efetiva dos “fatos psíquicos”. III II Se só tivéssemos o passado sob forma de **recordações** expressas, a cada instante seríamos tentados a evocá-lo para verificar sua existência, assim como aquele doente do qual fala Scheler, que se virava para assegurar-se de que os objetos estavam ali — quando sentimos o passado atrás de nós como um saber adquirido irrecusável. III II